APÓS SUPOSTO FIM DE TRÉGUA, SAPIRANGA (CE), TEM 1° HOMICÍDIO DO ANO

O assassinato aconteceu no cruzamento da rua Olegário Memória (foto) com a José Félix de Lima/ FABIO LIMA

O homicídio do jovem identificado como Elder Breno Silva Ferreira, de 28 anos, registrado no bairro Sapiranga, pode ter sido a primeira morte violenta decorrente da disputa pelo controle do tráfico de drogas na região desde que acordo de paz firmado por facções locais teria se desfeito.

Ocorrida no início da noite da última terça-feira, 18, no cruzamento entre as ruas Olegário Memória e José Felix de Lima, a morte estaria relacionada ao fim de um pacto que vigorava desde março de 2015. No resumo das principais ocorrências diárias divulgado pela Secretaria da Segurança não havia registro de homicídios na Sapiranga desde janeiro deste ano. O primeiro caso foi o de Elder.

O caso seria ainda um desdobramento dos episódios de conflito desencadeados em três presídios da Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), na madrugada da terça. E tudo faria parte de uma reação originada pela ruptura da aliança nacional entre as duas maiores facções criminosas do País, o Comando Vermelho (CV) e o Primeiro Comando da Capital (PCC), que teria acontecido em setembro último. O acordo de paz, com fins comerciais e de pura conveniência, durou quase duas décadas.

Conforme reportagem do site da BBC Brasil, as facções que sempre conviveram de forma “relativamente harmoniosa” no sistema prisional e nas ruas de diversos estados do País, atuando muitas vezes como um “consórcio criminoso” para a compra de armas e drogas, se tornaram rivais. A cisão estaria relacionada a uma disputa pelo controle de presídios e também a controle de rotas do tráfico internacional. O CV estaria perdendo cada vez mais terreno para o PCC.

O fim da aliança também teria desfeito acordos de proteção mútua aos integrantes das facções em prisões. No Ceará, O POVO apurou que detentos mantidos nas casas de Privação Provisória de Liberdade III e IV, em Itaitinga, e na Penitenciária Francisco Hélio Viana, em Pacatuba, estariam exigindo separação de membros por unidade, temendo confronto. Os presos que não se manifestaram membros de uma das fações também estariam sendo ameaçados.

Sem relação

A situação, contudo, foi negada pelo secretário-adjunto da Segurança Pública, coronel Lauro Prado. “Essa pacificação nunca existiu. Não temos muito que falar muito sobre isso”, afirmou ao O POVO, na tarde de ontem. Prado afirmou que a morte de Elder Breno estaria ligada à briga de gangues da região.

O coronel não soube informar, porém, por qual motivo nenhum outro homicídio decorrente da disputa entre facções tenha sido registrado na região antes do “anúncio” do fim do acordo. “Estou reunido com o comando da Guarda Municipal, das Polícias Militar e Civil neste momento, traçando estratégia para reforçar o policiamento naquela região e na Cidade como um todo, mais por conta dos boatos que qualquer coisa do tipo”, disse.

Ele negou ainda a existência de um “toque de recolher” na região e citou ter havido reforço do policiamento no Cais do Porto por conta de triplo homicídio que vitimou três mulheres, no último sábado, 15. (colaborou Jéssika Sisnando)

Saiba mais

Por volta das 22h43min, foram apreendidas uma pistola calibre 380, dois rifles calibre 28 e 22, munições, maconha e um rádio comunicador. O material foi abandonado pelos suspeitos do assassinato de Elder Breno, que fugiram.

Já na madrugada de ontem, por volta de 1h39min, uma pistola calibre ponto 40, com munições, foi apreendida pela PM na rua José Felix de Lima. Foram presos em flagrante Antônio Gabriel Sousa da Silva, 18, Eugenio Bruno de Sousa, 19, Laion Luiz Alves de Oliveira, 20, e Charles Dantas, 18.

Ponto de vista

Um Estado coadjuvante

Os órgãos de segurança do Ceará demoraram a aprender a lidar com a presença mais efetiva das duas principais organizações criminosas do Brasil (PCC e Comando Vermelho) no Estado. Desde agosto do ano passado, O POVO já alertava para a possibilidade de que a redução dos homicídios pudesse estar ligada a alguma forma de acerto entre grupos rivais. A tentativa de diminuir os impactos de toda essa movimentação foi frustrada. 

Em janeiro, o controle remoto do crime tornou-se mais visível e presente. Assistimos, desde então, relatos sobre como tais organizações impõem impunemente suas leis com mãos de ferro nas periferias, reconfigurando de maneira radical o mundo do crime. O Estado, todo esse tempo, desempenhou papel coadjuvante. Prisões ocorreram aqui e ali, mas até hoje não sabemos com precisão como esses criminosos atuam ou quem são os líderes de grupos como Família do Norte e Guardiões do Estado. 

A repercussão da notícia de que a guerra foi deflagrada não tardou a chegar por aqui. Enquanto isso, continuamos na incômoda posição de espectadores.

AUTOR: O POVO/RICARDO MOURA